A JUSTIFICATIVA ECONÔMICA PARA REDUZIR A VULNERABILIDADE DA INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES AOS DESASTRES NATURAIS NOTA DO SETOR DE TRANSPORTES DO BRASIL Junho de 2025 A infraestrutura de transporte no Brasil, bem como as atividades sociais e econômicas que dela dependem, está sujeita a riscos significativos decorrentes de eventos climáticos e desastres naturais. As mudanças climáticas intensificam essa vulnerabilidade, afetando diretamente corredores logísticos estratégicos, como aqueles utilizados para o escoamento de commodities agrícolas, incluindo a soja. Investimentos proativos e programas de manutenção voltados à adaptação climática das infraestruturas de transporte mais críticas podem evitar atrasos e desvios dispendiosos, além de custos elevados com a reconstrução de ativos estratégicos. Essas iniciativas apresentam elevado retorno sobre os investimentos. Além disso, mecanismos de gestão de riscos e de resposta emergencial no setor de transportes é crucial para minimizar perdas econômicas decorrentes da paralisação de fluxos logísticos. Tais Fonseca e Joanna Moody Agradecimentos: Esta nota faz parte de uma série de produtos analíticos e de assessoria do projeto Mobilidade e Logística para Sustentabilidade e Resiliência do Brasil (P179908), conduzido sob a supervisão de Bianca Bianchi Alves (Gerente de Prática, Transporte, América Latina e Caribe) e Luis Alberto Andres (Líder de Programa, Infraestrutura, Brasil). A equipe agradece aos colegas Jing Xiong (Especialista Sênior em Transportes), Alejandro Hoyos (Especialista Sênior em Transportes) e Frederico Pedroso (Especialista em Gestão de Riscos de Desastres) pela revisão técnica construtiva. Esta nota resume os achados analíticos de Guillaume L’Her, Amy Schweikert, Xavier Espinet, Lucas Eduardo Araújo de Melo, and Mark Deinert. (2024). “Transport resilience and adaptation to climate impacts – a case study on agricultural transport in Brazil,” Complex Networks and their Applications XII, (pp.243-250). http://doi.org/10.1007/978-3-031-53503-1_20 CONTEXTO A vasta e diversa geografia do Brasil resulta em uma variedade de riscos climáticos e naturais que ameaçam o desenvolvimento econômico e social do país (Figura 1). Em 2021, as perdas anuais causadas por desastres naturais foram estimadas em US$ 3,9 bilhões,1 e espera-se que as mudanças climáticas aumentem ainda mais a exposição do país a esses riscos nos próximos anos.2 As inundações e as chuvas intensas têm sido os desastres mais prejudiciais no Brasil. Desde 1991, esses eventos respondem por mais de 70% de todos os danos materiais, totalizando R$ 118 bilhões.3 Os deslizamentos de terra também são relevantes, representando 10% dos prejuízos. Figura 1. Riscos naturais históricos e atuais no Brasil No caso da infraestrutura de transportes do Brasil, ativos essenciais como rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos e pontes estão expostos a riscos climáticos e naturais. Entre esses riscos, destacam-se as inundações, deslizamentos de terra, incêndios e secas, que representam as maiores ameaças à infraestrutura de transportes do país e às atividades sociais e econômicas que dela dependem. 4 Uma análise em nível de ativo da exposição a cada um desses principais riscos indica que o valor total da infraestrutura de transportes exposta a pelo menos um desses perigos já ultrapassa US$ 358 bilhões, sendo que alguns ativos estratégicos enfrentam múltiplos riscos simultaneamente5 (Figura 2). • O valor de todos os ativos expostos a inundações supera US$ 254 bilhões.6 • Cerca de 25% de todas as rodovias, 23% das linhas ferroviárias, 7% dos portos e entre 10% e 17% dos aeroportos (médios e pequenos, respectivamente) estão localizados em áreas suscetíveis a 1The World Bank, “Country Climate Risk Profile: Brazil” https://climateknowledgeportal.worldbank.org/sites/default/files/2021-07/15915- WB_Brazil%20Country%20Profile-WEB.pdf 2World Bank. 2023. Brazil Country Climate and Development Report. https://www.worldbank.org/en/news/press-release/2023/05/04/brazil- can-be-both-richer-and-greener-world-bank-group-outlines-opportunities-for-climate-action-and-growth 3 Atlas Digital de Desastres no Brasil. URL: https://atlasdigital.mdr.gov.br/ 4O impacto dos desastres naturais varia conforme a localização, o tipo de ameaça e o tipo de infraestrutura. Por exemplo, as secas representam um risco importante para o transporte hidroviário, mas têm menor impacto sobre as rodovias. Deslizamentos de terra e inundações causam danos a ativos com estrutura em rede, como estradas e ferrovias, enquanto incêndios podem limitar as operações em todos os tipos de ativos. 5Os valores dos ativos são baseados nos custos médios de construção (substituição) a partir de dados nacionais disponíveis para rodovias, estradas primárias e secundárias, ferrovias, vias navegáveis, portos e aeroportos de pequeno e médio porte. Ativos expostos a múltiplas ameaças são contabilizados apenas uma vez no total. 6 A exposição inclui inundações pluviais e fluviais com profundidade estimada superior a 0,25 metros para o evento com probabilidade anual de 0,01 (isto é, “enchente de 100 anos”). 1 deslizamentos de terra de nível 2 ou superior — com um valor total de ativos expostos a esse risco estimado em US$ 264 bilhões. • O risco de incêndios, agravado por secas e calor extremo, atualmente ameaça entre 9% e 12% da malha rodoviária, 6% das linhas ferroviárias, entre 7% e 10% dos aeroportos e 12% dos portos. • As operações de 52% dos portos e de 35% dos quilômetros navegáveis estão expostas ao risco de seca, com um valor total de ativos expostos que ultrapassa US$ 92 bilhões. As mudanças climáticas tendem a agravar os riscos já existentes, especialmente por meio do aumento da intensidade das chuvas e das ondas de calor extremo.7 Estimativas indicam que, até 2040, mais de 35% da infraestrutura de transporte deverá enfrentar um aumento na ocorrência de eventos de precipitação intensa,8 e mais de 37% dos portos marítimos, 61% dos aeroportos de pequeno porte e 70% das hidrovias estarão sujeitos a um aumento nas temperaturas extremas.9 Figura 2. Exposição da infraestrutura de transporte aos impactos climáticos $140,000.00 80% $120,000.00 70% $100,000.00 60% 50% $80,000.00 40% $60,000.00 30% $40,000.00 20% $20,000.00 10% $- 0% Estimated Cost of Assets at Risk, USD ($, million) %over total value Os impactos dos riscos climáticos e naturais vão muito além dos danos materiais. As interrupções no acesso a serviços básicos, nos fluxos comerciais e nas cadeias de suprimento da indústria, viabilizados pela infraestrutura e pelos serviços de transporte, geram efeitos em cascata de natureza social e econômica. Na América Latina e no Caribe, estima-se que as empresas incorrem anualmente em custos adicionais equivalentes a aproximadamente 1% do PIB devido à interrupção de sistemas de infraestrutura, incluindo energia, transporte e água. No Brasil, esse valor é um pouco mais elevado: estima-se que as empresas 7NASA Center for Climate Simulation, “NASA Earth Exchange Global Daily Downscaled Projections (NEX-GDDP),” https://www.nccs.nasa.gov/services/data-collections/land-based-products/nex-gddp (acessado em 4 de maio, 2020). 8 A precipitação intensa é medida como a soma máxima de precipitação em um período de cinco dias no ano (“período de cinco dias mais chuvoso”). Os resultados apresentados para a exposição referem-se ao aumento da precipitação intensa em média anual para cada década (2030, 2040), em relação ao valor médio anual de uma linha de base histórica de trinta anos (1970–1999). As estimativas são calculadas utilizando o cenário RCP8.5 do CMIP5. 9 Indica exposição a um aumento de temperatura igual ou superior a 2 graus Celsius. As estimativas são calculadas utilizando o cenário RCP8.5 do CMIP5. 2 brasileiras percam cerca de 1,3% do PIB nacional por ano devido a interrupções na infraestrutura, sendo que as interrupções no transporte respondem por metade dessas perdas. Impactos Econômicos nas Cadeias de Suprimento: Exemplo das Vulnerabilidades Climáticas nas Rotas de Exportação de Soja A exportação de soja é o principal item individual de contribuição para o PIB do Brasil, representando US$ 26,1 bilhões em 2019.10 Em 2020, o país exportou cerca de 83 milhões de toneladas métricas de soja. Embora aproximadamente 35% da soja brasileira chegue aos portos por ferrovia, os 65% restantes são transportados por caminhão. Essa forte dependência do transporte rodoviário para o escoamento da soja contribui para altos custos logísticos e uma significativa exposição a riscos naturais, afetando uma cadeia de valor crucial tanto para a economia brasileira quanto para a segurança alimentar global. Danos à malha rodoviária causados por deslizamentos de terra, agravados por inundações e chuvas intensas, podem resultar em reparos dispendiosos,11 interrupção dos serviços e longos desvios. Para estimar os custos econômicos potenciais desses desvios, foi realizada uma análise de "drop-link" em 33 rotas críticas de exportação de soja (ver Figura 3). 12 Essas rotas foram selecionadas com base na exposição atual e futura a alto risco de deslizamentos, agravados por inundações e chuvas intensas.13 O custo da perda de cada segmento rodoviário crítico foi calculado como o custo incremental de redirecionamento necessário entre origem e destino, considerando o volume anual total de soja transportado por rota e o custo por tonelada-quilômetro. Mais de 900 segmentos da malha rodoviária principal foram analisados para o transporte de soja ao longo dessas 33 rotas. Embora os riscos de deslizamentos de terra estejam geograficamente concentrados — com apenas 57 dos 900 segmentos rodoviários analisados classificados como de alto risco — e distribuídos ao longo de poucos corredores, qualquer interrupção nesses trechos pode gerar custos muito elevados (ver Tabela 1). Considerando as condições atuais de exposição a deslizamentos e inundações, o dano a um único segmento rodoviário pode resultar em um aumento anual no custo de transporte da soja entre US$ 3 milhões (Rota 15) e US$ 744 milhões (Rota 27). Entre as 31 rotas analisadas sob as condições atuais de exposição, o aumento anual mediano no custo de transporte é de US$ 34 milhões (Rota 3). Esses custos tendem a ser agravados pelas mudanças climáticas. Quase 80% dos segmentos atualmente em risco também apresentam aumento de risco devido à intensificação das chuvas em cenários futuros de 10 The Observatory of Economic Complexity, “Soybeans in Brazil,” Feb. 2022. https://oec.world/en/profile/bilateral- product/soybeans/reporter/bra 11 Registros recentes indicam que os reparos decorrentes de um único evento podem variar de pouco mais de US$ 2.000 a mais de US$ 3 milhões. (The World Bank, “Improving Climate Resilience of Federal Road Network in Brazil,” Maio 2019) 12Um total de 31 rotas de exportação, que representaram a maior parte das exportações de soja no país durante 2020-2021, foram avaliadas com base em dados de transporte e exportação de referência provenientes de D. L. Salin, “Soybean Transportation Guide: Brazil 2020,” United States Department of Agriculture, Ago. 2021. 13A identificação dos trechos da malha expostos a interrupções foi baseada em sobreposição geoespacial com conjuntos de dados internacionais sobre ameaças naturais: (i) risco de deslizamentos com base no Global Landslide Hazard Map, publicado pelo Banco Mundial (2021) – https://datacatalog.worldbank.org/search/dataset/0037584/ ; (ii) risco de inundação com base no modelo global de risco de inundação em alta resolução desenvolvido por Sampson et al. (2015), “A high-resolution global flood hazard model,” Water Resources Research, 51(9), 7358–7381 – https://doi.org/10.1002/2015WR016954 ; e (iii) projeções de precipitação intensa futura para a década de 2040, com base no cenário RCP8.5 do CMIP5, utilizando a métrica do “período de cinco dias mais chuvoso” da base NASA’s Earth Exchange Global Daily Downscaled Projections (NEX-GDDP) – https://www.nccs.nasa.gov/services/data-collections/land-based-products/nex-gddp. 3 mudanças climáticas até 2040. Áreas com aumento de precipitação intensa em 2040 poderão enfrentar riscos ainda maiores de inundações e deslizamentos. Tabela 1. Trechos Prioritários para Investimentos em Resiliência ID da Origem → Destino Annual Volume (kt) Custo da Interrupção (% do Nível de Prioridade Rota Ótimo) 27 Sorriso → Itaituba 6.933 152%** Alta 29 Sorriso → Santarém 5.264 59%** Alta 28 Sorriso → Porto Velho 7.318 34%* Média Notas: Os resultados completos por rota estão disponíveis na Tabela A1 do Anexo. A Figura 3 apresenta as rotas analisadas e os trechos críticos “perturbados” ou interrompidos na análise de drop-link. O custo total por estado foi calculado somando todos os segmentos dentro de seus limites geográficos que exigiriam desvios em caso de falha por deslizamentos de terra, inundações ou chuvas intensas. Figura 3. Custos estimados por estado resultantes da interrupção de rotas. Também são apresentados, para cada uma das 33 rotas analisadas, a origem, o destino, o trajeto percorrido e os trechos considerados na análise de drop-link. Pará e São Paulo registram os maiores impactos econômicos totais (ultrapassando US$ 1,9 bilhão caso todas as rotas interrompidas venham a falhar). No Pará, os altos custos potenciais de desvio se devem à baixa densidade da malha rodoviária nacional no estado, o que leva a percursos alternativos muito longos. Em São Paulo (e, em menor grau, no Paraná), os altos custos estão associados ao grande número de segmentos rodoviários expostos a alta e muito alta suscetibilidade a deslizamentos, inundações e chuvas 4 intensas — além da importância de seus portos como destino de várias das rotas de exportação de soja analisadas. Já o Mato Grosso, apesar de ser o maior exportador de soja do país, apresenta riscos relativamente menores de deslizamentos, o que reduz o impacto total sobre sua infraestrutura. CAMINHO A SEGUIR Diante da clara necessidade econômica de enfrentar a exposição e a vulnerabilidade da infraestrutura de transportes no Brasil a riscos climáticos e naturais, os próximos passos devem priorizar investimentos em transportes resilientes ao clima, visando garantir serviços sustentáveis, comércio e logística. A transição de uma abordagem focada em ativos individuais para uma abordagem sistêmica — considerando o desenvolvimento de corredores — fortaleceria o planejamento da resiliência. Os programas de investimento em transporte resiliente devem ser elaborados com base na abordagem de ciclo de vida,14 contemplando cinco pilares fundamentais: (1) planejamento e financiamento do sistema, (2) engenharia e projeto, (3) operações e manutenção, (4) planejamento de contingência e (5) capacidade institucional e coordenação. As três recomendações a seguir para o fortalecimento dos investimentos em transporte resiliente no Brasil abrangem esses cinco pilares. 1. Desenvolver programas de investimento proativos para promover a adaptação climática de ativos de transporte estratégicos e ao longo dos principais corredores econômicos. Para fortalecer a resiliência da infraestrutura de transportes do Brasil diante do aumento dos riscos climáticos, é essencial adotar uma abordagem de investimento preventiva e orientada para o futuro, com foco em ativos vulneráveis e corredores logísticos críticos. Aplicando os dois primeiros pilares da abordagem de ciclo de vida da resiliência, intervenções proativas — como a prevenção de deslizamentos e a modernização de sistemas de drenagem — podem reduzir os impactos econômicos na malha rodoviária federal do país entre 5% e 50%.15 Alcançar as metas de desenvolvimento sustentável do Brasil até 2030 exigirá um investimento estimado de US$ 434 bilhões em infraestrutura rodoviária (equivalente a 17,8% do PIB). Esse valor inclui um cenário de referência que pressupõe a cobertura total do Índice de Acesso Rural, o que demandaria US$ 155 bilhões em novas infraestruturas, US$ 70 bilhões para manutenção da malha existente e US$ 108 bilhões para substituição de ativos que atingirão o fim de sua vida útil até 2030. Esses valores foram calculados com base em condições climáticas históricas. Considerando a vasta extensão territorial do país, sua conectividade natural por rios e os limites ambientais, uma abordagem mais direcionada — que não necessariamente alcance 100% do Índice de Acesso Rural via transporte rodoviário — tende a ser mais adequada. Nesse cenário de investimento direcionado, o custo adicional de US$ 20 bilhões necessário para garantir a resiliência dos investimentos rodoviários até 2030 é relativamente marginal (com outros US$ 34 bilhões necessários para garantir a resiliência até 2040). Grande parte desses investimentos será voltada à prevenção de deslizamentos de terra e à adaptação da rede de drenagem das rodovias, para garantir maior capacidade de escoamento e responder ao aumento dos riscos de inundações. No entanto, 14 Keou, O. et al. (2025). Disaster and Climate-Resilient Transport Guidance Note, DC: World Bank, 15 The World Bank, “Improving Climate Resilience of Federal Road Network in Brazil,” The World Bank, Maio 2019 5 a efetiva priorização desses investimentos depende da capacidade de avaliar sistematicamente a vulnerabilidade e o risco dos ativos. Para isso, a resiliência deve ser incorporada como um critério central nos processos de planejamento de infraestrutura. Os Sistemas de Gestão de Ativos Rodoviários (Road Asset Management Systems – RAMS) podem desempenhar um papel fundamental nesse esforço, ao integrar dados sobre a condição dos ativos com mapas geoespaciais de riscos climáticos e avaliações de vulnerabilidade. Essa integração permite identificar segmentos de alto risco e direcionar os investimentos com base tanto na condição estrutural quanto nos impactos climáticos projetados. Para operacionalizar esses sistemas, é essencial investir em coleta robusta de dados, compartilhamento de informações entre agências e coordenação institucional — destacando a importância de mecanismos sólidos de governança e do fortalecimento de capacidades nas instituições envolvidas (Pilar 5 da abordagem de ciclo de vida da resiliência). Especificamente para as exportações de soja, concentrar programas de investimento proativo em adaptação climática nos principais corredores econômicos pode gerar retornos econômicos positivos de US$ 2 em benefícios para cada US$ 1 investido em adaptação. As necessidades totais de investimento em adaptação para esses corredores econômicos somam US$ 470 milhões, com benefícios potenciais de US$ 980 milhões ao longo de um período de 20 anos. Dos 57 segmentos expostos analisados, há apenas 1 segmento cujo custo para reduzir proativamente os impactos de deslizamentos é superior ao custo de reparo e desvio. 16 Ao considerar os custos decorrentes da interrupção do transporte de outras mercadorias e pessoas nesses corredores, os retornos econômicos provavelmente serão ainda maiores. Esses resultados destacam a necessidade de uma abordagem abrangente para identificar áreas de risco e onde são necessárias melhorias proativas, bem como os custos associados a reparos e interrupções. O planejamento é essencial para priorizar intervenções resilientes com base no risco, na criticidade dos ativos e na análise de custo-benefício. Investimentos contínuos nessas áreas e em outras capacidades de resposta a emergências e a riscos podem reduzir ainda mais os impactos potenciais de ameaças sob as condições climáticas atuais e futuras. Esses achados reforçam a necessidade de uma abordagem de planejamento abrangente e orientada por riscos, que combine a condição física dos ativos, a vulnerabilidade climática e a análise dos impactos econômicos. Incorporar esses critérios nas estratégias nacionais de investimento e nos marcos de gestão de ativos será fundamental para garantir a resiliência e a confiabilidade da infraestrutura de transportes do Brasil diante dos cenários climáticos futuros. 2. Investir em manutenção rotineira de rodovias de forma mais frequente e efetiva. A boa manutenção e a gestão eficiente de ativos são fundamentais para a criação de rodovias resilientes (Pilar 3 da abordagem de ciclo de vida da resiliência). O aumento da frequência e da intensidade de 16Os custos iniciais de investimentos proativos variam conforme a rota, uma vez que cada rota possui um número específico de trechos expostos a riscos de deslizamento, inundação e/ou precipitação intensa futura. Para avaliar se o custo combinado de redirecionamento e reparos em cada trecho superaria os custos de medidas proativas de mitigação e da redução dos impactos do redirecionamento, foram realizadas duas análises. Primeiro, foi calculado o custo de melhoria de uma rota (custo médio por ponto de US$ 100.450) e a consequente redução no impacto, considerando dois cenários: uma redução de 5% e de 50% nos impactos (estimada pela redução correspondente nos custos de redirecionamento). Em seguida, esse custo, para cada rota, foi comparado com a abordagem reativa – calculada como o custo de reparo de um trecho após o dano ter ocorrido (custo médio de US$ 492.910), somado ao custo de redirecionamento resultante da perturbação. 6 eventos naturais extremos devido às mudanças climáticas acelera a degradação das estradas. A Figura 4 compara a deterioração da qualidade das rodovias ao longo do tempo em dois cenários: com e sem mudanças climáticas. A linha contínua representa o cenário de referência, enquanto a linha tracejada ilustra a deterioração acelerada provocada pelos impactos climáticos, como chuvas mais intensas e temperaturas mais elevadas. A Figura 4a mostra que, no cenário com mudanças climáticas, as condições das estradas pioram mais rapidamente, resultando em uma vida útil significativamente mais curta. Já a Figura 4b demonstra que a realização de manutenções rotineiras contribui para reduzir e retardar essa deterioração, gerando, no longo prazo, uma redução de custos de até 40% em comparação com estratégias atuais que negligenciam a manutenção até que a estrada atinja um estado crítico de degradação. 17 A justificativa econômica para uma manutenção mais eficiente já foi amplamente comprovada, com economias na reabilitação variando de US$ 6 a US$ 10 18 para cada dólar investido, mesmo sem considerar os efeitos das mudanças climáticas. Figura 4. Impactos das mudanças climáticas na deterioração e na vida útil das rodovias: (a) sem e (b) com manutenção rotineira . A conservação adequada das rodovias também permite identificar com maior facilidade pontos de obstrução ou trechos que necessitam de melhorias. A manutenção e operação resilientes podem ser estruturadas por meio de contratos plurianuais com base em desempenho, como os contratos CREMA (Contrato de Recuperação e Manutenção), com o objetivo de mobilizar investimentos do setor privado e integrar, de forma proativa, medidas de manutenção resilientes ao clima. No Brasil, a implementação de uma nova geração de contratos CREMA pode incluir a exigência de um Plano Básico de Gestão de Riscos Climáticos e Resiliência como obrigação contratual, contribuindo assim para a sustentabilidade de longo prazo.19 Além disso, os Sistemas de Gestão de Ativos Rodoviários (RAMS) devem apoiar a manutenção eficaz e a reabilitação de ativos resilientes por meio da incorporação de dados sobre vulnerabilidade 17Jackson, N. Mike, Deepak Dave, Peter E. Sebaaly, and Gail L. Porrit. “Preventive surface treatments versus traditional corrective maintenance measures.” In Transportation Research Circular No. E-C078: Roadway Pavement Preservation 2005: Papers da First National Conference on Pavement Preservation, Kansas City, Missouri 31 de Outubro – 1 Novembro, 2005. pg. 120-131. 18Ogita,Satoshi; Palsson,Gylfi; Mills,Leslie Nii Odartey. Assessing Economic Efficiency of Long-Term Road Asset Management Strategies (English). Washington, D.C. : World Bank Group. 19 “Diaz Fanas, Guillermo; Xiong, Jing; Gall, Helen. 2025. Transport Resilience Financing, Resources and Opportunities. World Bank. 7 climática, promovendo a transparência e o compartilhamento de informações entre os diversos atores do setor rodoviário. A participação do setor privado por meio de contratos de manutenção de longo prazo com base em desempenho pode aumentar a eficiência, a confiabilidade e a sustentabilidade na prestação de serviços. Esses modelos contratuais promovem o planejamento baseado no ciclo de vida, garantem maior previsibilidade das necessidades de financiamento e criam incentivos para a preservação das condições dos ativos ao longo do tempo. Paralelamente, a inclusão de microempresas comunitárias na realização de atividades rotineiras e localizadas de manutenção — como a remoção de detritos e pequenos serviços de drenagem — pode ampliar a cobertura dos serviços em áreas remotas ou pouco atendidas, ao mesmo tempo em que gera empregos locais e promove a inclusão social. 3. Preparar planos de resposta a emergências para minimizar os impactos de eventuais interrupções. Mecanismos eficazes de resposta a emergências no setor de transportes são essenciais para minimizar as perdas econômicas causadas por interrupções no tráfego. Nossa análise indica que aumentar o tempo de resposta a interrupções em corredores econômicos estratégicos de 1 para 2 dias pode gerar um impacto econômico superior a US$ 900 milhões ao longo de um horizonte de 20 anos. Os investimentos em resposta a emergências podem incluir a garantia de disponibilidade de equipamentos adequados, como veículos de emergência, máquinas pesadas e materiais sobressalentes. A resposta emergencial pode ser estruturada por meio de contratos de prontidão com cláusulas rotativas para manutenção rodoviária, que podem ser ativados utilizando uma abordagem paramétrica. Essa estratégia permite que os contratos firmados sejam adaptados para responder a desastres por meio de mobilização cruzada ou subcontratação. Os órgãos rodoviários devem instituir uma unidade central de resposta a emergências, responsável pela elaboração de planos de resposta e protocolos de comunicação, com forte cooperação e coordenação com outros atores envolvidos na gestão de emergências e desastres, como a Defesa Civil e os serviços meteorológicos e geológicos. Essa articulação é fundamental para o desenvolvimento de sistemas de alerta precoce e sistemas de informação meteorológica para rodovias, que possam ser integrados aos protocolos de decisão sobre fechamento de vias. Para acelerar intervenções complexas, o Brasil se beneficiaria da adoção de estruturas mais ágeis de contratação e gestão financeira. Ferramentas como contratos pré-aprovados, orçamentos de contingência e protocolos de emergência podem reduzir significativamente os tempos de resposta a eventos que vão além da remoção rotineira de detritos. A participação do setor privado — por meio de contratos-quadro ou contratos baseados em desempenho — também pode contribuir para a realização oportuna de obras de manutenção e emergência. A prontidão institucional pode ser fortalecida por meio de instrumentos de planejamento ex-ante, como mapas de risco climático elaborados em parceria com a Defesa Civil e órgãos de transporte, e contratos de prontidão com cláusulas flexíveis para mobilização rápida e adaptação de escopo. 8 Tabela A2. Informações específicas por rota de exportação de soja e impactos estimados das interrupções. Custo de interrupção/desvio sob Informação da Rota Rota ótima (sem interrupções) condições atuais de exposição Aumenta com (média das perdas por segmento) precipitação intensa ≥20% em Custo anual Custo diário comparação à Custo anual Custo diário Volume anual total, Distância com desvio com desvio Percentual linha de base Cidade de Origem Porto de total (US$ total (US$ # 2020–2021 (mil Estimada (US$ (US$ da rota histórica ao longo Destino milhões de milhões de toneladas) (km) milhões de milhões de ótima (%) da rota? 2020) 2020) 2020) 2020) 1 Cruz Alta, RS Rio Grande 14.509 477 761 2,09 159 0,44 21 Não 2 Sorriso, MT Santos 3.852 2.015 621 1,70 51 0,14 8 Sim 3 Sorriso, MT Paranaguá 3.723 2.178 649 1,78 34 0,09 5 Sim 4 Rio Verde, GO Santos 6.163 1.005 495 1,36 83 0,23 17 Sim 5 Rio Verde, GO Paranaguá 5.007 1.261 505 1,38 21 0,06 4 Sim 6 Londrina, PR Paranaguá 4.109 519 234 0,64 31 0,08 13 Sim 7 Mamborê, PR Paranaguá 3.081 569 175 0,48 14 0,04 8 Sim 8 Uberaba, MG Santos 3.852 565 239 0,66 71 0,20 30 Sim 9 Assis Chateaubriand, PR Paranaguá 2.953 632 168 0,46 14 0,04 8 Sim 10 São Desidério. BA Salvador 8.474 1.791 1.366 3,74 92 0,25 7 Sim 11 Primavera do Leste, MT Santos 3.081 1.662 358 0,98 36 0,10 10 Sim 12 Primavera do Leste, MT Paranaguá 2.825 1.918 379 1,04 6 0,02 2 Sim 13 Maracaju, MS Paranaguá 4.494 1.093 393 1,08 17 0,05 4 Sim 14 Maracaju, MS Santos 4.109 1.094 360 0,99 53 0,14 15 Sim 15 Assis Chateaubriand, PR Santos 2.054 969 159 0,44 3 0,01 2 Sim 16 Cristalina, GO Santos 2.439 949 208 0,57 37 0,10 18 Sim 17 Cornélio Procópio, PR Paranaguá 2.311 571 119 0,33 12 0,03 10 Sim 18 Castro, PR Paranaguá 2.568 260 93 0,26 14 0,04 15 Sim 19 Guarapuava, PR Paranaguá 2.953 351 135 0,37 20 0,05 15 Sim Custo de interrupção/desvio sob Informação da Rota Rota ótima (sem interrupções) condições atuais de exposição Aumenta com (média das perdas por segmento) precipitação intensa ≥20% em Custo anual Custo diário comparação à Custo anual Custo diário Volume anual total, Distância com desvio com desvio Percentual linha de base Cidade de Origem Porto de total (US$ total (US$ # 2020–2021 (mil Estimada (US$ (US$ da rota histórica ao longo Destino milhões de milhões de toneladas) (km) milhões de milhões de ótima (%) da rota? 2020) 2020) 2020) 2020) 20 São Gabrieldo Oeste, MS Santos 3.081 1.199 259 0,71 35 0,09 13 Sim 22 Canarana, MT Santos 4.237 1.634 554 1,52 53 0,14 10 Sim 24 Canarana, MT Paranaguá 3.723 1.890 493 1,35 5 0,01 1 Sim 25 Tupanciretã, RS Rio Grande 3.210 457 147 0,40 32 0,09 22 Não 26 Chopinzinho, PR Paranaguá 2.183 522 125 0,34 12 0,03 10 Sim 27 Sorriso, MT Itaituba 6.933 884 490 1,34 744 2,04 152 Não 28 Sorriso, MT Porto Velho 7.318 1.800 922 2,53 318 0,87 34 Sim 29 Sorriso, MT Santarém 5.264 1.340 494 1,35 293 0,80 59 Não Notas: As interrupções foram calculadas considerando a intransitabilidade de trechos individuais expostos a inundações e deslizamentos (exposição atual), bem como deslizamentos em regiões com aumento de precipitação intensa (exposição projetada para a década de 2040). Um total de 31 rotas foi considerado, mas os resultados incluem apenas os trechos onde foram identificados danos na malha rodoviária. 1 © 2025 Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento/Banco Mundial 1818 H Street NW, Washington DC 20433 Internet: https://www.worldbank.org/transport Isenção de responsabilidade padrão Este trabalho é um produto da equipe do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento / Banco Mundial. As descobertas, interpretações e conclusões expressas neste trabalho não refletem necessariamente as opiniões dos Diretores Executivos do Banco Mundial ou dos governos que eles representam. O Banco Mundial não garante a precisão dos dados incluídos neste trabalho. Os limites, cores, denominações e outras informações mostradas em qualquer mapa deste trabalho não implicam qualquer julgamento por parte do Banco Mundial sobre o status legal de qualquer território ou o endosso ou aceitação de tais limites. 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